O MONÓLOGO DE HAMLET - SER OU NÃO - VIVER OU NÃO VIVER - SER O QUÊ? VIVER O QUÊ?



Com certeza Shakespeare quando escreveu Hamlet, fez com aquela maestria que o filósofo ao ouvir sua peça ficou de queixo caído com o teor, mas que o homem simples ficou maravilhado, embora não pudesse captar de imediato a profundidade de algumas idéias, que só a intuição compreendeu com a precisão de alguém que enxerga outro na bruma. Creio que o grande dramaturgo inglês tinha um estilo, que podemos comparar nos dias atuais a Bob Dylan, universalmente falando, e a Zé Ramalho, brasileiramente exemplificando.

Sempre fui fascinado pelo monólogo de Hamlet. Em 2003 adaptei para uma linguagem coloquial apenas o monólogo, a partir da tradução de Barbara Heliodora da peça Hamlet, da Clássicos Abril Coleções. A idéia foi montar uma esquete, onde o personagem intérprete do monólogo foi um vaqueiro, este organizador de rebanhos, vestido a caráter, com uma lamparina na mão, a exemplo de Diógenes. 

Divido com vocês a adaptação, para uma linguagem bem coloquial do monólogo conhecido como: SER OU NÃO SER, EIS A QUESTÃO?! Porém com profunda preocupação de manter a essência do autor. Audácia? Sim, audácia. Mas Darwin já dizia: As águias voam alto não é porque são fortes, tornam-se fortes porque voam alto. Voemos alto e fortaleçamos nossa musculatura física e espiritual.

Eis o texto:

ADAPTAÇÃO SHAKESPEARE PARA LINGUAGEM COLOQUIAL PEÇA HAMLLET - ATO TERCEIRO - CENA 1-


Ser ou não ser, eis a questão ! Vale a pena continuar vivendo em meio a tão terríveis dores??? por que resistir a tanto sofrimento, ao tão pesado fardo que é  viver o dia a dia? Vale relmente a pena continuar vivendo??? Qual o prêmio, qual troféu, qual a recompensa??? Se tudo é um eterno sofrer ??!! É tão fácil por um fim a tudo... por que continuar resistindo??? Morrer!!! dormir!!! Dormir!! Morrer!!! Dormir!!!? Que diferença faz??? Dormir... apenas dormir... nada mais!!! Talvez sonhar... Sonhar!!! Livre da dor, do flagelo, do pesar do coração, nesse caminhar chamado vida... Dormem os mortos no cemitério!!! Deixaram de existir? Mas afinal o que é o existir... se a noite límpida é um cemitério de estrelas que sem existir continuam existindo... Talvez morrer seja apenas uma mudança de estado no carrossel da dialética cósmica...

Mas por que esse medo? Por que essa hesitação se é tão forçoso viver??? A final não é fácil agüentar a crueldade dos fatos do dia a dia, as humilhações, o desprezo, a difamação do invejoso, a exploração do opressor, a afronta do orgulhoso, a angústia do amor desprezado, a lentidão da justiça, ainda por cima costumeiramente injusta, a hipocrisia dos falsos moralistas, a sacanagem dos políticos, a safadagem dos poderosos...!!!!!!!! A parcialidade da mídia e os interesses egoísticos prevalecendo sobre o idealismo humanitário. É possível que o temor não passe do medo de intervir no natural desenlance do por vir universal...

Como suportar tão dura carga, tão fácil pendurar-se numa corda, tão simples cortar os punhos com um estilete... Jogar-me nos trilhos do metrô...Mas por que hesito? por que temo?  Por que fala mais alto o desejo de viver se tão desumana é a vida??? A alguns o desespero. A outros as drogas... ainda assim a felicidade, eterna miragem perseguida por indivíduos, civilizações que sempre se frustraram. Toda a realidade na verdade, puro pessimismo ao que se antepõe ao otimismo, que se resume à tênue esperança....

É o temor.. só pode ser o medo daquilo além da morte! ........ Morte o que é morte? Que mundo misterioso é esse de onde viajante algum jamais voltou.... Realmente existe?.... Não existe? Tudo.... tudo não passa de incerteza.... tudo não passa da mais profunda dúvida.... Os que não acreditam no além da vida desejam viver eternamente, apegando-se a vida como um náufrago à tábua da salvação... e.... mesmo os que acreditam na eternidade da alma gastam até o último centavo para não morrer... evitando irem cedo para eternidade, onde dizem não existir males, dor, nem sofrimento...

É por isso... Só por isso que todos querem viver... Por isso que hesito, que todos nós hesitamos e apesar de tudo escolhemos viver... apesar de todos os pesares... de ser o mundo um vale  de dores e de sofrimento. Pois, embora seja doloroso, terrivelmente doloroso viver... a vida é um certeza que tocamos, uma estrada onde pisamos, um fato de que ninguém pode duvidar, uma verdade da qual nem os cegos ou loucos discordam ser verdadeira... o que existe além da vida é apenas teoria... conjectura.. hipótese... talvez... dúvida... silêncio!!! SILÊNCIO!!!  Quero ouvir minha respiração.... sentir o coração palpitar forte no peito... o sangue rasgando o túnel de minhas veias... Sou vida a mais pura vida...  um ser vivo... vivo verdade... vivo certeza..... vivo... pois a vida em meio a todas as verdades e mentiras será sempre uma certeza... viva... à vida!!!!

Ofereço a quem leu até o fim, a música abaixo tema do filme Highlander, cuja tradução seria QUEM DESEJA VIVER PARA SEMPRE:



Comentários

Eu destacaria de seu texto as transcrições abaixo:

"Tudo.... tudo não passa de incerteza.... tudo não passa da mais profunda dúvida...."

"Pois, embora seja doloroso, terrivelmente doloroso viver... a vida é um certeza que tocamos, uma estrada onde pisamos, um fato de que ninguém pode duvidar, uma verdade da qual nem os cegos ou loucos discordam ser verdadeira... o que existe além da vida é apenas teoria... conjectura.. hipótese... talvez... dúvida... silêncio!!! SILÊNCIO!!!"

Sem dúvida é um texto que nos empurra à reflexão. O ser humano está em contínua busca da felicidade e quando não se a encontra mais é que ele, o ser humano, desiste da caminhada. Mas aos relutantes em viver, ainda que sob pesar, sabe que, por ser um fato a vida, tem a real esperança de que ela poderá, um dia, proporcionar momentos felizes, ao passo que o pós-morte é um oceano de incertezas, cujas regras não estão concretamente esclarecidas, daí, repito, a opção por viver aqui.

Se o prazer e a dor pós-morte são um fato, tal realidade está obscura à humanidade. Sendo uma premissa verdadeira, não é logicamente aceitável a existência de juízos tão pesados como é costumeiramente ensinado, a menos que o dono desse juízo não seja justo como se pretende.

Quando se está sofrendo, comumente desejamos recuar no tempo como forma de cessarmos os efeitos. Quando estamos felizes, comumento desejamos a eternidade temporal a fim de que não cessem os efeitos.

Empiricamente sabemos que uns sofrem enquanto outros sorriem; ora os que sofrem surriem e ora os que sorriem sofrem. Essa reviravolta e inconstância fazem da vida um tremendo mistério, impossível de ser decifrado a olho nu.

"Melhor um pássaro na mão do que dois voando", já diz um antigo adágio. Vida e morte (pós-vida) são um fato, mas a incerteza do pós-morte é que nos condiciona, em momentos de apuros, à decisão pela vida.

Quem um dia nunca se deparou com um monólogo como esse? Quem? O que muda é o contexto, inclusos aí alguns elementos, como intensidade.

Eis um mistério: há momentos em que ser religioso é melhor do que a inclinação à incredulidade; em outros, o inverso. Segue, disso, a existência de certezas e incertezas. E quem é conhecedor o necessário para dirimir quaisquer dúvidas sobre máximas ditas certas e incertas?

Quem? A resposta a esta pergunta se encerra com um ponto-final, um ponto de interrogação ou reticências?

Voltemos a Hamlet e ao texto de Valdecy Alves, quem sabe encontraremos a resposta.

.
Júnior Miranda disse…
Olá Valdecy,

gostaria de lhe informar que estou com um novo blog, o Folha 13, pois o anterior,o "Blog do Júnior Miranda", foi hackeado. Por isso, recomendo que vc retire o link do antigo blog de sua lista.

O link do meu novo blog é: www.folha13.blogspot.com

Abs!
JOÃO JOSÉ disse…
Olá colega Blogueiro !

Passando.... para dizer que é sempre um orgulho seguir o seu Blog.
Seu espaço é muito útil.

Perfeito a sua adaptação do texto de Shakespeare! Muito bom !!
Realmente a vida... nos traz momentos reflexivos ! Não basta apenas viver! É preciso refletir!
E seu texto nos faz um convite pra esse momento importante (...)!!

Parabéns pelo Texto e pelo Blog.

Saudações !!!
Abraços !
Ira Buscacio disse…
Valdecy,

Achei maravilhoso. Ousadia, sim! E pq não? Quem não voa, não conhece o céu e a liberdade sem culpa.

Vivemos com essas reflexões e o seu monólogo captou a essência de Hamllet misturando-se a nossa modernidade.

Bjão
Anônimo disse…
Gostaria apenas de parabenizar pela iniciativa e "ousadia", como assim bem o expressa,no inicio de suas transcriçoes.
O fato de hesitar para nao entregar os pontos,"abandonar a vida" se reside na máxima que o homem ainda sonha utopicamente num mundo justo,honesto e onde se sobresaia a dignidade humana acima de tudo.
Aproveitando a oportunidade,vou deixar duas frases de minha autoria,ao qual acho que se encaixa aqui:
"Ousar Crescer, é ter como projeto de vida a Liberdade"(Claudeci Moreira)

"O nosso único próposito nesta vida é ser Feliz" (Claudeci Moreira)

Abraços a Todos.
Prezado confrade Dr. Valdecy Alves!
Impossível não se encantar ou se emocionar com sua argutíssima adaptação do monólogo "Ser ou não ser, eis a questão"!!!! Como é árduo/fascinante enfrentar as atribuições e atribulações do nosso cotidiano, bem como conviver com pessoas que padecem da "cegueira branca"!!! Quanto tempo da minha insulsa existência ainda resta?!... Como é dolorosíssimo ter ciência que um dia desaparecerei para sempre... Por que há existência quando poderia não haver nada?!...
Lembrei-me do inquietante, magnífico e filosófico poema, que a notável Cecília Meirelles (1901-1964) nos brindou, que a seguir transcrevo:

"Ou Isto ou Aquilo

Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo."

Por Dionísio!!!... Como é encantador/aterrador ter a consciência de que o tempo é inexorável, da nossa finitude, bem como que vivemos escolhendo sempre...
Caloroso abraço! Saudações filosóficas!
Até breve...
João Paulo de Oliveira
Diadema-SP

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